quarta-feira, 24 de junho de 2009

ZINE Nº002

Cruspian@,


No zine nº1 nós fizemos algumas perguntas e contamos umas histórias. Provavelmente, deu para ter uma idéia de duas coisas: de quem (ou do que) tratam as histórias que contamos, e qual o perfil daqueles que as contaram. Neste n°2w queremos compartilhar com vocês algumas reflexões sobre a vida no Crusp e como pensamos que a Associação de Moradores pode se relacionar com isso.


GRUPOS DE TRABALHO

Um dos problemas que observamos ao longo das várias gestões que se sucederam na Amorcrusp é o da falta de participação de outros moradores além do pessoal das chapas. Por um lado, as pessoas eleitas para a gestão não conseguem, via de regra, dar conta do volume de trabalho correspondente às idéias propostas. O outro lado da moeda é a dificuldade de outros moradores se integrarem de fato ao trabalho da associação, seja por conta da falta de abertura da gestão em curso ou pela falta de uma definição clara das tarefas a serem desempenhadas e do grau de autonomia que os demais moradores tem para realizar alguma ação.

No nosso entendimento, a associação não pode ficar restrita à gestão, não pode executar somente o que surgir da cabeça de seus membros eleitos. É preciso que a Amorcrusp esteja aberta, através de reuniões e assembléias, para que todos os moradores do Crusp tenham oportunidade de participar das decisões tomadas, e possam propor aos demais as ações que julguem benéficas à coletividade. Por outro lado, que não haja separação entre aqueles que propõem e aqueles que executam. Com base nisso, propomos a criação de grupos de trabalho para executar ações e projetos propostos pelos moradores. Esses grupos teriam autonomia para planejar seu trabalho e propor gastos, prestando contas à associação, que as repassaria a todos os moradores. A criação dos grupos de trabalho, bem como a definição de suas funções e gastos, estaria sujeita à Assembléia dos Moradores do Crusp, e uma vez aprovados, poderiam seguir seu trabalho de modo autônomo.



VILA CRUSP

A despeito das paredes finas e porosas, que fazem com que muitos sons que compõem a intimidade de cada morador sejam compartilhados com seus vizinhos, há um reforço institucional ao isolamento. A inexistência de espaços de convivência e sociabilidade, o curtíssimo prazo estipulado pela Coseas para o ingresso por afinidade, a valorização desta instituição como árbitro das disputas entre moradores, o controle dos porteiros sobre a freqüência dos visitantes, somados à falta de uma influência cruspiana forte nos rumos da moradia: isso tudo promove o isolamento e dificulta que os moradores do Crusp efetivamente se associem, constituam uma coletividade consciente de si mesma. Muitos encaram esta moradia como um mero conjunto de dormitórios, onde descansamos nossas mentes e corpos cansados da labuta acadêmica. Outros tornam seu exíguo espaço um lar, ainda que provisório, e tentam se apropriar deste local de modo semelhante ao que fariam num bairro qualquer da cidade.

Diante desse quadro, entendemos que é válida qualquer proposta de dar uma cara mais humana ao Crusp: festas para adultos e crianças, eventos culturais, horta, mais cores nas paredes, abrir espaço para palestras, debates e oficinas sobre assuntos de interesse coletivo (e não propaganda ideológico-religiosa paga, como andamos presenciando nos últimos meses). As propostas não têm que partir sempre da gestão da Amorcrusp, que nem teria gente disponível para fazer tudo isso. Mas acreditamos que aqueles que são eleitos devem, ao menos, assegurar o apoio com equipamento, local, divulgação e tudo aquilo que o orçamento e a estrutura material da associação permitirem. A entidade tem que manter e ampliar seus recursos materiais, e não corroborar com o extravio, a dificuldade de acesso e a falta de manutenção dos bens da associação. É o mínimo que devemos fazer com o dinheiro conseguido com os aluguéis do térreo do F, fruto do consumo, em grande parte, dos próprios cruspianos. Serviços como o das bicicletas e da sala de vídeo tem que ser mantidos e ampliados, e não restritos a um pequeno número de pessoas ou mesmo suprimidos.



ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA

Quando não há organização, mesmo as ações repletas de boa vontade podem se perder e não alcançar seus fins. Formulários, fichas de cadastro, notas, assinatura de papéis, por mais chatos que pareçam tem uma razão para existirem: garantir o bom uso dos bens coletivos. Como cobrar dos indivíduos o mau uso de objetos se não há documentos que comprovem o empréstimo? Como saber o valor de certas despesas se não há notas que as atestem? Devemos confiar em comunicados que se pretendem oficiais e não trazem sequer uma assinatura?

Acreditamos que, ainda que uma gestão não acrescente nada ao patrimônio da Amorcrusp, o mínimo que ela deve fazer é administrar o que já foi conquistado anteriormente, cuidar bem disso e garantir o acesso de todos os moradores aos bens de uso coletivo, sem que eles tenham que depender de relações pessoais para tanto.

Coleção Armando Paduan, foto 6, vista do apto C 604. http://fotolog.terra.com.br/crusp68:1



“CHAMA O SÍNDICO...”

Nem só de estudos, política e diversão vive o cruspiano. Quem já não teve que percorrer duas ou três cozinhas para encontrar um fogão que funcionasse, ou teve que esperar meses por um conserto? Se é verdade que a associação de moradores deve defender, frente à Coseas e à reitoria, os interesses dos que aqui vivem, quem mais indicado para cobrar a manutenção dos equipamentos de uso coletivo administrados por tais órgãos?

Entendemos que a função da Amorcrusp é, também, servir de instrumento oficial de cobrança e pressão pelo atendimento das reivindicações cruspianas. E, para que as demandas dos moradores sejam efetivamente atendidas, propomos representantes de bloco eleitos em assembléia que seriam responsáveis por repassar as reivindicações específicas mais urgentes de cada bloco à associação. Os representantes de modo algum substituirão a participação dos moradores nas assembléias. Não temos que esperar que os agentes da Coseas reclamem à administração por serviços que eles não utilizam, nem devemos abandonar os moradores à condição de indivíduos isolados, lutando como pequenos Davis contra os Golias institucionais. Afinal: nós temos ou não temos uma entidade que defenda nossos interesses? Acreditamos que a sede da Amorcrusp deva, também, ser o local para onde o cruspiano insatisfeito com a estrutura da moradia pode se dirigir, com a certeza de que contará com o peso institucional da associação para lutar por melhorias.



POLÍTICA NO QUINTAL DE CASA

As questões políticas, ainda mais para quem vive num lugar que se originou de uma ocupação ( lembram-se do zine nº01?), dentro de uma universidade pública, batem freqüentemente à nossa porta. Nos últimos dias tivemos duas grandes questões: os limites da política de permanência estudantil (refletida do descaso da Assembléia Geral dos Estudantes quanto à inclusão do tema na pauta da greve, bem como no racionamento alimentar empurrado pela Coseas) e as bombas da PM que explodiram em nosso quintal. “Quem cala, consente”, e assim sendo é fundamental que associação de moradores promova o debate dessas questões (e de outras que surgirem), para expressar uma posição surgida do Crusp, seja ela qual for. Nossa experiência da última Assembléia de Moradores (em que cerca de 150 pessoas aprovaram, por consenso, um novo cálculo de quantidade para a distribuição de alimentos, uma reunião de negociação e um ato para apoiá-la) nos leva a crer que muitos esperam, apenas, que se abra o espaço do debate, para se fazerem ouvir e somar forças nas lutas que a Amorcrusp tiver coragem de assumir, com base na expressão da vontade dos moradores.

Nesse contexto se insere também a discussão de tudo aquilo que a Coseas faz com relação a nós. Não devemos demonizar, muito menos santificar essa coordenadoria: ela é uma estrutura de poder, criada pela administração da USP, e que representa muito mais a esta que aos moradores do Crusp. Nosso entendimento é de que devemos assumir a responsabilidade de analisar e discutir tudo aquilo que interfere em nossa vida por aqui. A Amorcrusp foi criada pelos cruspianos justamente para ser nosso braço institucional frente à Coseas. Devemos, como gestão, assumir o lugar que nos cabe na correlação de forças existente no contexto da moradia estudantil, fazendo da Amorcrusp um interlocutor firme, ativo, e atento aos anseios de seus associados (todos os moradores), e nunca deixá-los sem voz diante da fala incessante da Coseas e da reitoria.

Só para retomar alguns temas: a extinção da bolsa-trabalho, os critérios arbitrários de seleção e manutenção do benefício das bolsas moradia e alimentação, bem como toda forma unilateral (made in Coseas) e não-discutida de regulamentação da vida no Crusp... tudo isso nos sugere que temos muito ainda para conversar.



“HASTA LA VICTORIA” OU “HASTA LA VISTA”?

Tentamos apresentar aqui as razões pelas quais montamos a chapa, mas muito mais que isso: falamos de nossos anseios, do que nos incomoda e nos une a várias pessoas. Tudo que aqui se encontra é fruto de anos de convívio e conversas, de visitas a vários apartamentos, de encontros nos corredores e no bandejão. De qualquer forma, qualquer semelhança entre o que aqui foi expresso e a vida real não é mera coincidência, e nós vamos conversar de novo sobre tudo isso, tenhamos ou não nos tornado gestão.

Contudo, queremos reiterar nosso propósito de assumir junto com vocês a responsabilidade de gerir a Amorcrusp com outra cabeça, voltada para o coletivo, com respeito pela história e pelas conquistas do Crusp.


Dos cubículos do Crusp, com a cabeça erguida, o olho no horizonte e a mão estendida aos companheiros e companheiras que chegarem para a caminhada.

Coleção Célia e Beto Bergamasco - Foto 4 Equilíbrio 4. http://fotolog.terra.com.br/crusp68:1

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